3 oct 2012

[Itália] Operaçom Ousadia.- Dous escritos de Giulia desde o cárcere de Rebibbia

Recolhemos de Contra Info estas duas cartas desta luitadora, na primeira fala, com muita ironia, de como foi considerada perigosa terrorista e na segunda fai umha crítica a esses pseudojornalistas servis que criticarom a detençom na Rússia das Pussy Riot e que alabam as detençons na Itália das activistas anti-TAV. Clicando en "leer mas" tendes acesso a leitura destes dois moi interesantes textos


Desde um cárcere

Atençom! Atençom!

Isto, a 100 dias da minha detençom, é um pequeno aporte que quero fazer para poner-vos a todxs em guarda.

1) Se, por algum casual, tendes lâmpadas na casa, tende coidado, poderedes arrepentir-vos. Pero se nom podedes fazer menos que ter algumha, nom tenhades na casa outras lámpadas que aquelas que já estám colocadas. Quando algumha se funda, caminharedes na obscuridade e, só entom, poderedes mercar umha novas. Nom tanto, assegurar-vos de tira-las rotas, porque também essas, segundo indicaçom os agudíssimos Ros (NdeT.- polícias especiais anti-terroristas) e a fiscal, som umha forma óptima de fabricar bombas.

2) Se vedes oportuno embelecer a vossa presência física com pendentes, fijadevos em nom merca-los de cobre. E se, por casualidade, um amigo ou amiga vos quere regalar um par, desfazedevos deles sem demora, dado que som armas perigossísimas.

3) Se nom tendes a obssesiva costume de dar um lugar para cada cousa, senom que sodes desordenadxs e tendedes a ter umha caixa de ferramentas improvisada onde, entroutras cousas, tendes cravos e clips, que decir-vos? Evidentemente sodes perigosxs terroristas, preparadxs para montar bombas a cada momento.

4) Se vos passa de ter na casa travas para tende-la roupa, nom de plástico, senom de madeira, incinerade-las, queimade-las, esparcide as suas cinzas aos quatro ventos. Nom tendes nem ideia do que se agocha detrás delas.

Querendo falar a sério, tuda esta ladainha de pequenos avissos, mas nom carentes de importância, servem porque na noite em que fum detida atoparam na minha casa, onde moro com o meu companheiro (e na que eu nom estava presente) lámpadas de reposto, pendentes de cobre, cravos, clips e umha trava de madeira. Eles juntarom-no tudo, fotografarom-no e organizarom-no de tal jeito que parecera um conjunto de objectos para preparar artefactos explossivos. De feito, assim foi como apresentarom, os Ros e a fiscal, o material confiscado na minha casa, durante a audiência da revissom do meu arresto.

Nom falemos já do feito de que, nom havendo atopado nengum material escrito que descrevira como preparar tais bombas, digeram, estes grandes conhecedores da minha pessoa, que eu nom o precisava, "dado que tudo estava na minha mente, na minha boa memória!" . Qualquer comentário é superfluo, nom si?.

Gostaria de engadir um último ponto à lista, ainda que a primeira vista poidera parecer um pouco inerente aos anteriores:

5) Se este mundo da-vos nojo, se repudiades a guerra, a exploraçom e a devastaçom; se nunca tivestedes medo a dize-lo; se nunca tendes baixado a cabeça pensando “eu nom podo fazer nada”; se sempre pugestedes a cara; se tendes claro na vossa consciência de quem som os responsáveis das terríveis vidas que levamos; se estades convencidxs de que a sociedade na que vivemos está lobotomizada; se nom conseguides mirar umha jaula com indiferência; se o vosso coraçom se vos fecha, vos ferve o sangue, se vos nubla a vista ao pensar numha mulher, num home ou num animal encirrado, bah, tarde ou cedo, como di umha mulher encirrada acá comigo: "Tes-te que fazer ao cárcere".

E se este o meu ser, esta Giulia que estou descubrindo forte, digna, ainda mais convencida das suas ideias e desdenhosa com a aniquilaçom à que, quem me mantem encirrada, quereriam lançar-me; se este ser meu, eles querem etiqueta-lo como perigoso, que fabrica bombas, que participa em asociaçons subversivas (tal vez, afiliada à FAI-Informal, a pesar de que qualquer cousa que eu figerao, digera ou pensara, nom poida fazer pensar de jeito algum, numha mínima adesom ou participaçom pola minha banda) desenhadas para aterrorizar e sementar o pánico entre a gente, bah, eu nom lhe-lo permito e devolto-lhe tudo ao remitente.

Terrorista é quem encirra, quem golpea com a porra, quem devasta. E, assim, parafraseando umha cançom, que tremem os poderosos; ante os ánimos feros de todas estas “terroristas”, que nom tenhem medo de luitar contra tudo aquilo que realmente gera e fortalece o terror, a discriminaçom, a desigualdade, a devastaçom, a exploraçom.

Que tremam, que tenham medo! O seu verdadeiro temor é que sabem que qualquer jaula na que me metam arredor, já seja umha cela, um trabalho, a difamaçom, ou o ailhamento, nada me quitará as ganas de rompe-la e de seguir mirando o mundo com olhar lúcido, duro, vital e livre.

Que se estrugem bem os seus cerebros para encontrar aneis milhores para as minhas cadeias, eu serei mais forte. Porque tenho em mim um conhecemento, umha consciência do que som, que jamais melharám.

Que se especialicem no arte sublime (realmente, arte do nosso tempo) de reinventar o sinificado das palavras, alá onde guerra convirte-se em misiom de paz; lá onde as bombas som inteligentes e nom som perigosas e os pendentes de cobre e lámpadas, explosivos perigosos; lá onde o terrorismo nom define a quem encirra, mata, reprime senom a quem critica tudo isso; lá onde a devastaçom chama-se civilizaçom, progresso ou riqueza; lá onde nom aceitar o status quo da injustiza é sinónimo de perigrosidade social; lá onde axs imigrantes encarceradxs se lhes chama hóspedes.

As minhas palavras nom tenhem o peso da história do nosso tempo, da raiva, da insolência, das ganas de acabar com tuda crueldade, a ferocidade da jaula que encerra a vida de todxs nos, dentro e fora dos cárceres, escravxs dumha vida que nom queremos, dum mundo que se desmorona e que chama aos seus resíduos progresso.

Com quem luitam, com quem nom se submetem.

As bombas e o terror sementa-os o Estado, o Poder e a nossa santa Democracia.

Pola liberdade de todxs.

Una mujer libre.
Giulia.


Is There Anybody Out There? (Há alguem lá fora?)

Fai-me pensar que tudo o alboroto criado polo desafortunado destino das Pussy Riot, além da onda de indignaçom e solidariedade jurdida de todas as mentes democráticas de jornalistas, cantantes, homes e mulheres de governo, nascera do atenuante polo uso, no momento do “acto criminal”, de simpáticos passa-montanhas de cores.

Personalmente, estou case certa. Também porque, sejamos sinceirxs, as cores chamam mais a atençom, alegram-nos a vida, fam-nos ser mais comprensivxs e abertxs com xs demais.

Do contrário, nom se entenderia nunca como os jornalistas, os primeiros em catapultarse com “ousados” artículos idóneos para apresentar aos inimigos da sociedade (terroristas encarapuçadxs acusadxs de colgar faixas, de ofender à República e às suas instituiçons com perigosas acçons subversivas distribuindo cola e pintura nas paredes da cidade) nas primeiras páginas dos seus jornais, houveram abraçado a causa das Pussy Riot.

Seguramente, depende da cor do passa-montanhas!

Sim, porque na democracia tam obstentada por elxs e desde as alturas das que mandam as suas invectivas contra o mau malíssimo de Putin e o medieval Patriarca da Igreja de Moscova, umha situaçom semelhante nom se teria produzido nunca.

Ou melhor, teriam-se produzido se os passa-montanhas ou as sudadeiras com carapuça fossem negras. Se na igreja, em troques do nome de Putin, houveram berrado (e nom para alabar) o dalgum conhecido cosificador ou encadenador das nossas vidas, um ministro, um chefe da polícia, qualquer político, qualquer crego poderoso de Roma.

Nom sei quantos jornalistas indignados distos últimos tempos forom lêr o código penal da nossa santa democracia. Crio que, mais bem, poucos.

Por outra banda sabe-se, o trabalho é tanto, a defensa dos direitos democráticos (dos doutros paises) nom conhece límites, é umha dura carreira e nom se pode perder o tempo.

Mas eu que tenho o tempo, estando encirrada num cárcere por um tempo que nom se me quere dizer (detida na espera de juízo), pensei em botar-lhes umha mão a vostedes, cabaleiros, na sua nobre laboura.

Artículo 405 do Código Penal. Alteraçom das funçons religiosas de culto dumha confesom religiosa: "Quem impida ou perturbe o ejercício das funçons, ceremónias ou práticas religiosas de culto dumha religiom… será castigado com prisom de até dous anos". Engaderia o delito de estar encarapuçada (Lei n° 152, de 22/05/75): "Proibe-se o uso de cascos ou qualquer outro meio que dificulte o reconhecemento da pessoa num lugar público ou aberto ao público sem um bo motivo… em manifestaçons… a excepçom das deportivas. O infractor será castigado com pena de prissom de um a dous anos e multa de 1000 a 2000 euros". E, porque nom, vilipéndio a quem seja (religiom, presidente da república, república e as suas instituiçons)… Que cansanço.

Em resumo, se as Pussy Riot tiveram feito o mesminho em Itália, teriam tido um tratamento tal vez muito pior.

Agora, por suposto, nom me interesam as liçons de direito comparado, também porque o meu conhecemento deste aciago mundo, que nom me pertence, é moi limitado.

Só gostaria de "explorar o mundo de Sam Patrício das vossas democracias" para agitar em rio revolto. Se as minhas palavras tiuveram a força da minha raiva, provavelmente, seria muito mais eficaz, mais implacável na exposiçom das minhas argumentaçons.

Pergunto-me se os defensores da liberdade distos dias escreverám os seus artículos com ingénua consciência ou com o clásico sujo servilismo hipócrita que os distingue. Aquilo que lhes permite adicar páginas e páginas de agradecemento a quem salvou ao pais de terroristas perigosxs, sem se molestar em compreender o desenho real oculto tra-lo encarceramento de tantas pessoas, metendo as notícias dos seus patrons, agochadas com alguns adjetivos algo literários (a fim de fazer o artículo mais aceptável para os olhos dum leitor, a maior parte das vezes, descerebrado pero exigente) e construindo um mundo fictício.

Um servilismo que garante a sua integridade moral aos olhos da opiniom pública, que ve-lhes luitar contra as injustizas assassinas de Assad, contra a detençom das Pussy Riot, por Assange, para nom ter, assim, que dar explicaçons do seu sujo e verdadeiro trabalho dirigido na Pátria, o único polo qual a prensa tem o permiso de existir, ou seja, justificar, servir ao Poder, ao Estado e aos seus secuaces.

Assim, os rebeldes sirios som tais, os de Val di Susa som terroristas e violentos; as Pussy Riot som disidentes reprimidas polo sistema dictatorial ruso, entanto, quem em Itália é acusadx de fazer pintadas ou de colgar faixas contra a guerra, o governo ou os responsaveis dos desastres ambientais é um perigossísimo subversor da ordem democrática a quem há que meter no cárcere (incluso antes do juízo, por suposto).

Ai, sinto-o, esquecia-me! Provavelmente na democrática Itália, as Pussy Riot, além dos mentados artículos do Código Penal, veriam caer enriba de-las o, sem dúvida, tam querido 270bis, artículo sobre a cresta da onda. Também porque numha igreja, cantar contra o governo, sendo tres, qué é senom umha asociaçom subversiva com fins subversivos, com "a agravante de pedir a ajuda da virgem" (e acolá, se se passara a mãos dum cura/fiscal, também lhes caeria enriba "brujaria e herejia"?)?.

Claro que as minhas palavras caem no vazio das vossas escravas cabeças, caros jornalistas, vos desejo já seja poder continuar o vosso fundamental e necessário trabalho, ou nom mirar-vos nunca no espelho. Nom vaiades a ver um uniforme em troques da vossa roupa, umha cadeia onde deveriades ter o cerebro, umha porra em troques da vossa pluma.

Nom tanto, para evitar equívocos, solidariedade com as Pussy Riot, nom no nome da democracia e dos seus direitos, senom em nome da liberdade, contra os cárceres e os seus carcereiros, contra todos os benpensantes que sinalam com o dedo desde o outro lado da sua valha sem mirar o barro que chega aos seus pés.

Dito isto, espero que as Pussy Riot nom caiam numha rogatória internacional que as involucre numha asociaçom subversiva intergaláctica .

Um saúdo de Giulia
umha subversiva sem passamontanhas de cores, presa no cárcere de Rebibbia.

Bo fim de vrao!

Para escrever.lhe:
Giulia Marziale
CC Rebibbia Femminile
Via Bartolo Longo 92
00156 Roma
Italia

Colado e traduzido por Edu

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